30 de nov. de 2018

OAB - 2015.3 - XVIII - Segunda Fase - Direito Penal (APELAÇÃO)

FGV - 2015.3 - OAB - XVIII Exame de Ordem Unificado - Segunda Fase - Direito Penal

(Aplicada em 17/01/2016)

Durante o carnaval do ano de 2015, no mês de fevereiro, a família de Joana resolveu viajar para comemorar o feriado, enquanto Joana, de 19 anos, decidiu ficar em sua residência, na cidade de Natal, sozinha, para colocar os estudos da faculdade em dia. Tendo conhecimento dessa situação, Caio, vizinho de Joana, nascido em 25 de março de 1994, foi até o local, entrou sorrateiramente no quarto de Joana e, mediante grave ameaça, obrigou-a a praticar com ele conjunção carnal e outros atos libidinosos diversos, deixando o local após os fatos e exigindo que a vítima não contasse sobre o ocorrido para qualquer pessoa.

Apesar de temerosa e envergonhada, Joana contou o ocorrido para sua mãe. A seguir, as duas compareceram à Delegacia e a vítima ofertou representação. Caio, então, foi denunciado pela prática como incurso nas sanções penais do Art. 213 do Código Penal, por duas vezes, na forma do Art. 71 do Estatuto Repressivo. Durante a instrução, foi ouvida a vítima, testemunhas de acusação e o réu confessou os fatos. Foi, ainda, juntado laudo de exame de conjunção carnal confirmando a prática de ato sexual violento recente com Joana e a Folha de Antecedentes Criminais (FAC) do acusado, que indicava a existência de duas condenações, embora nenhuma delas com trânsito em julgado.

Em alegações finais, o Ministério Público requereu a condenação de Caio nos termos da denúncia, enquanto a defesa buscou apenas a aplicação da pena no mínimo legal. No dia 25 de junho de 2015 foi proferida sentença pelo juízo competente, qual seja a 1ª Vara Criminal da Comarca de Natal, condenando Caio à pena privativa de liberdade de 10 anos e 06 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado. 

Na sentença consta que a pena base de cada um dos crimes deve ser aumentada em seis meses pelo fato de Caio possuir maus antecedentes, já que ostenta em sua FAC duas condenações pela prática de crimes, e mais 06 meses pelo fato de o acusado ter desrespeitado a liberdade sexual da mulher, um dos valores mais significativos da sociedade, restando a sanção penal da primeira fase em 07 anos de reclusão, para cada um dos delitos.

Na segunda fase, não foram reconhecidas atenuantes ou agravantes. Afirmou o magistrado que atualmente é o réu maior de 21 anos, logo não estaria presente a atenuante do Art. 65, inciso I, do CP. Ao analisar o concurso de crimes, o magistrado considerou a pena de um dos delitos, já que eram iguais, e aumentou de 1/2 (metade), na forma do Art. 71 do CP, justificando o acréscimo no fato de ambos os crimes praticados serem extremamente graves. 

Por fim, o regime inicial para o cumprimento da pena foi o fechado, justificando que, independente da pena aplicada, este seria o regime obrigatório, nos termos do Art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90. Apesar da condenação, como Caio respondeu ao processo em liberdade, o juiz concedeu a ele o direito de aguardar o trânsito em julgado da mesma forma.

Caio e sua família o (a) procuram para, na condição de advogado (a), adotar as medidas cabíveis, destacando que estão insatisfeitos com o patrono anterior. Constituído nos autos, a intimação da sentença ocorreu em 07 de julho de 2015, terça-feira, sendo quarta-feira dia útil em todo o país.

Com base nas informações acima expostas e naquelas que podem ser inferidas do caso concreto, redija a peça cabível, excluída a possibilidade de Habeas Corpus, no último dia do prazo para interposição, sustentando todas as teses jurídicas pertinentes. (Valor: 5.00 pontos)

Obs.: o examinando deve fundamentar suas respostas.

A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação.





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Modelo da peça:


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE NATAL/RN

Processo n. ...

Caio, já qualificado nos autos em epígrafe, por seu advogado infra-assinado, com procuração em anexo, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, interpor RECURSO DE APELAÇÃO, com base no art. 593, I, do Código de Processo Penal, requerendo seja recebido o presente recurso com o devido processamento, já com as razões inclusas, remetendo-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte.


        Nestes termos, 
      
        Pede deferimento,

        Natal/RN, 13.07.2015

        Advogado, OAB n. ...


EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE


APELANTE: Caio
APELADO: Ministério Público

Processo n. ...



RAZÕES DE RECURSO DE APELAÇÃO

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO
COLENDA CÂMARA



I- DOS FATOS

Caio, no carnaval de 2015, à época com 20 anos de idade, entrou na casa de Joana enquanto ela estava sozinha, pois sua família havia viajado para passar o feriado fora, e mediante grave ameaça obrigou Joana praticar com ele conjunção carnal e outros atos libidinosos diversos, exigindo à vítima que não contasse sobre o ocorrido para qualquer pessoa.

No entanto, Joana contou para a sua mãe e ambas foram a delegacia e ela ofertou representação. Caio, então, foi denunciado como incurso nas penas do art. 213 do Código Penal, por duas vezes, na forma do art. 71, também do Código Penal. 

Durante a instrução o apelante confessou o delito praticado. Foi, ainda, juntado laudo de exame de conjunção carnal confirmando a prática de ato sexual violento recente com Joana e a Folha de Antecedentes Criminais do acusado, que indicava a existência de duas condenações, embora nenhuma delas com trânsito em julgado.

Em alegações finais, o Ministério Público postulou pela procedência da denúncia em todos os seus termos, e a defesa requereu a aplicação da pena em seu mínimo legal. 

No dia 25.06.2015 o magistrado proferiu condenatória, condenando Caio à pena privativa de liberdade de 10 anos e 06 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado. Na sentença, para cada crime,  o magistrado aumentou a pena-base em seis meses pelo fato de Caio possuir maus antecedentes, já que ostenta em sua FAC duas condenações pela prática de crimes, e mais 06 meses pelo fato de o acusado ter desrespeitado a liberdade sexual da mulher, restando a sanção penal da primeira fase em 07 anos de reclusão, para cada um dos delitos.

Na segunda fase da dosimetria, o magistrado não reconheceu nenhuma atenuante, e alegou que o réu era maior de 21 anos de idade na época da sentença, o que não incidiria a atenuante prevista no art. 65, inciso I, do Código Penal. 

Ao analisar o concurso de crimes, o magistrado considerou a pena de um dos delitos, já que eram iguais, e aumentou de 1/2 (metade), na forma do art. 71 do Código Penal, justificando o acréscimo no fato de ambos os crimes praticados serem extremamente graves. 

Por fim, o regime inicial para o cumprimento da pena foi o fechado, justificando que, independente da pena aplicada, este seria o regime obrigatório, nos termos do art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90.

II- DO DIREITO

a) Do mérito

a.1) Do crime único

Narram os autos que o apelante praticou com a vítima conjunção carnal e outros atos libidinosos diversos. Apesar da prática da conjunção carnal e outros atos libidinosos, tal conduta não se configura dois crimes de estupro. O apelante cometera um único crime, pois nos termos do art. 213 do Código Penal, o agente que tem conjunção carnal ou pratica outro ato libidinoso ao constranger alguém mediante violência ou grave ameaça, pratica estupro. 

No entanto, contrariando a lei, o magistrado condenou o réu por dois crimes de estupro, na forma do art. 71 do Código Penal. 

Logo, requer não seja reconhecido o concurso de crimes, e seja aplicado o art. 213 do Código Penal uma única vez. 

a.2) 
Dos maus antecedentes

Nobres julgadores, o magistrado, além de aplicar o concurso de crimes, agravou a pena-base de cada crime em 06 meses, com a alegação que Caio possui maus antecedentes, haja vista a sua folha de antecedentes criminais. 

No entanto, a folha de antecedentes criminais indica duas condenações sem sentença transitada em julgado, e nos termos da súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, é vedada a utilização de ações penais em curso para gravar a pena-base.  

Requer, com base na súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, seja afastada a utilização de maus antecedentes como motivo para agravamento de pena, sendo aplicado, por conseguinte, a pena mínima. 

a.3) Da elementar do crime de estupro

O magistrado agravou a pena do delito em 06 meses com o argumento de que o réu havia desrespeitado a liberdade da mulher, no entanto, as penas do tipo penal do art. 213, da Carta Repressiva, já é penalidade pela conduta de estupro praticada. Assim, o agravamento da pena com o argumento de desrespeito a liberdade da mulher configura bis in idem


Logo, requer o afastamento do agravamento da pena sob o argumento do desrespeito da liberdade da mulher. 

a.4) Da confissão


Na segunda fase da dosimetria o magistrado não reconheceu nenhuma atenuante. No entanto, consta dos autos que o réu confessou o delito praticado, sendo imperioso o reconhecimento da atenuante prevista no art. 65, inciso III, d, do Código Penal. 

Logo, requer seja aplicada a atenuante da confissão espontânea. 

a.5) Da menoridade relativa

Na segunda fase da dosimetria, o magistrado também não reconheceu a atenuante da menoridade relativa, sob o argumento que à época da sentença o réu era maior que 21 anos. No entanto, nos termos do art. 65, inciso I, do Código Penal, SEMPRE atenuará a pena se o agente era à época dos fatos menor de 21 anos. 

Logo, requer seja aplicada a atenuante da menoridade relativa. 

a.6) Do regime inicial do cumprimento de pena

Se os nobre julgadores aplicarem a pena mínima ao delito único de estupro praticado pelo apelante, com o afastamento dos agravamentos da pena e a aplicação das atenuantes arguidas, a pena aplicada será de 06 anos de reclusão, pois é a mínima prevista para o crime de estupro. 

Ainda que tal crime seja considerado como hediondo, o regime inicial de cumprimento de pena, nos termos do art. 33, §2º, b, do Código Penal, deve ser o semi-aberto, pois reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal a inconstitucionalidade do §1º, do art. 2º, da Lei 8.072/90. 

Além disso, tem-se o disposto na súmula 440 do Superior Tribunal de Justiça, que aduz que 'fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito'. 

Logo, requer seja estabelecido o regime inicial de cumprimento de pena o semi-aberto. 

a.7) Da subsidiariedade

Em rara hipótese dos nobres julgadores não reconhecerem que a conduta do réu não configura crime único, e resolva aplicar a incidência do art. 71, do Código Penal, reconhecendo o crime continuado, que apliquem pena mínima aos delitos, com o aumento de pena previsto no referido artigo em sua fração mínima, qual seja, um sexto. Isto porque é pacificado na doutrina e jurisprudência que a fração a ser aplicada deve ser pela quantidade de crimes cometidos e não algum outro critério em abstrato. 


III- DOS PEDIDOS

Ante o exposto, requer seja REFORMADA a sentença do juiz de 1º grau, com o consequente PROVIMENTO deste recurso, a fim de que: 

a) não seja reconhecido o concurso de crimes, e seja aplicado o art. 213 do Código Penal uma única vez. 

b) seja afastada a utilização de maus antecedentes como motivo para agravamento de pena, sendo aplicado, por conseguinte, a pena mínima. 

c) afaste-se o agravamento da pena sob o argumento do desrespeito da liberdade da mulher. 

d) seja aplicada a atenuante da confissão espontânea. 

e) seja aplicada a atenuante da menoridade relativa. 

f) seja estabelecido o regime inicial de cumprimento de pena o semi-aberto.

Subsidiariamente, em caso de reconhecimento de crime continuado, requer:

g) o aumento da pena de um dos crimes na sua fração mínima de um sexto. 

Natal/RN 13.07.2015

Advogado, OAB n. ... 

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