5 de dez. de 2018

OAB - 2016.2 - XX - Segunda Fase - Direito Penal (ALEGAÇÕES FINAIS)

FGV - 2016.2 - OAB - XXI Exame de Ordem Unificado - Segunda Fase - Direito Penal

(Prova aplicada em 18/09/2016)

Astolfo, nascido em 15 de março de 1940, sem qualquer envolvimento pretérito com o aparato judicial, no dia 22 de março de 2014, estava em sua casa, um barraco na comunidade conhecida como Favela da Zebra, localizada em Goiânia/GO, quando foi visitado pelo chefe do tráfico da comunidade, conhecido pelo vulgo de Russo. Russo, que estava armado, exigiu que Astolfo transportasse 50 g de cocaína para outro traficante, que o aguardaria em um Posto de Gasolina, sob pena de Astolfo ser expulso de sua residência e não mais poder morar na Favela da Zebra. 

Astolfo, então, se viu obrigado a aceitar a determinação, mas quando estava em seu automóvel, na direção do Posto de Gasolina, foi abordado por policiais militares, sendo a droga encontrada e apreendida. Astolfo foi denunciado perante o juízo competente pela prática do crime previsto no Art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06. Em que pese tenha sido preso em flagrante, foi concedida liberdade provisória ao agente, respondendo ele ao processo em liberdade. 

Durante a audiência de instrução e julgamento, após serem observadas todas as formalidades legais, os policiais militares responsáveis pela prisão em flagrante do réu confirmaram os fatos narrados na denúncia, além de destacarem que, de fato, o acusado apresentou a versão de que transportava as drogas por exigência de Russo. Asseguraram que não conheciam o acusado antes da data dos fatos. Astolfo, em seu interrogatório, realizado como último ato da instrução por requerimento expresso da defesa do réu, também confirmou que fazia o transporte da droga, mas alegou que somente agiu dessa forma porque foi obrigado pelo chefe do tráfico local a adotar tal conduta, ainda destacando que residia há mais de 50 anos na comunidade da Favela da Zebra e que, se fosse de lá expulso, não teria outro lugar para morar, pois sequer possuía familiares e amigos fora do local. Disse que nunca respondeu a nenhum outro processo, apesar já ter sido indiciado nos autos de um inquérito policial pela suposta prática de um crime de falsificação de documento particular. 

Após a juntada da Folha de Antecedentes Criminais do réu, apenas mencionando aquele inquérito, e do laudo de exame de material, confirmando que, de fato, a substância encontrada no veículo do denunciado era “cloridrato de cocaína”, os autos foram encaminhados para o Ministério Público, que pugnou pela condenação do acusado nos exatos termos da denúncia.

Em seguida, você, advogado (a) de Astolfo, foi intimado (a) em 06 de março de 2015, uma sexta-feira. 

Com base nas informações acima expostas e naquelas que podem ser inferidas do caso concreto, redija a peça cabível, excluída a possibilidade de Habeas Corpus, no último dia do prazo, sustentando todas as teses jurídicas pertinentes. (Valor: 5,00) 

Obs.: O examinando deve indicar todos os fundamentos e dispositivos legais cabíveis. A mera citação do dispositivo legal não confere pontuação.





----------------
Modelo da peça:


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ... VARA CRIMINAL DA COMARCA DE GOIÂNIA/GO

Processo n. ...

Astolfo, já qualificado nos autos supra, vem, por meio de seu advogado legalmente habilitado, apresentar ALEGAÇÕES FINAIS, com fundamento legal no art. 403, §3º, do Código de Processo Penal, pelos motivos de fato e de direito a seguir aduzidos: 

1. DOS FATOS

Consta do processo que o réu primário, nascido em 15 de março de 1940, teria, no dia 22 de março de 2014, sido obrigado, pelo traficantes de drogas Russo, a levar droga de um local para o outro. 


Tal imperatividade foi materializada pela ameaça de ser expulso de sua casa caso não fizesse o que lhe era requisitado. Astolfo, então, se viu obrigado a aceitar a determinação, mas quando estava em seu automóvel, na direção do Posto de Gasolina, foi abordado por policiais militares, sendo a droga encontrada e apreendida. 

Após o início da persecução penal, o réu foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006. Foi-lhe concedida liberdade provisória. Durante a audiência de instrução e julgamento, as testemunhas de acusação confirmaram os fatos narrados na denúncia, além de destacarem que, de fato, o acusado apresentou a versão de que transportava as drogas por exigência de Russo. Asseguram que não conheciam o acusado antes da data dos fatos. 

Astolfo, em seu interrogatório, confirmou que fazia o transporte da droga, mas alegou que somente agiu dessa forma porque foi obrigado pelo chefe do tráfico local a adotar tal conduta, ainda destacando que residia há mais de 50 anos na comunidade da Favela da Zebra e que, se fosse de lá expulso, não teria outro lugar para morar, pois sequer possuía familiares e amigos fora do local. Disse que nunca respondeu a nenhum outro processo, apesar de já ter sido indiciado nos autos de um inquérito policial pela suposta prática de um crime de falsificação de documento particular. 

Após a juntada da Folha de Antecedentes Criminais do réu, apenas mencionando aquele inquérito, e do laudo de exame material, confirmando que, de fato, a substância encontrada no veículo do denunciado era "cloridrato de cocaína", os autos foram encaminhados para o Ministério Público, que pugnou pela condenação do acusado nos exatos termos da denúncia. 

A defesa foi intimada em 06 de março de 2015. Eis o que havia para relatar. 

2. DO DIREITO

2.1 DO MÉRITO

O réu deve ser absolvido por não caracterizar o fato infração penal. Senão vejamos:

a) Da inexigibilidade de conduta diversa

Para que determinada conduta seja considerada crime, deve ser ela típica, ilícita e culpável. Um dos elementos da culpabilidade é a exigibilidade de conduta diversa, sendo, portanto, a inexigibilidade de conduta diversa uma causa de exclusão de culpabilidade. 

Russo, estando armado, ao exigir que o réu, um senhor de 74 anos de idade, transportasse droga, sob pena de expulsá-lo de sua casa e da comunidade da Favela da Zebra, sem ele ter outro local para residir, praticou coação moral irresistível. 

Diante das circunstâncias e das particularidades do caso concreto, em especial considerando a idade de Astolfo e o fato de não ter familiares para lhe dar abrigo, não seria possível exigir outra conduta do acusado. Conforme previsão do art. 22 do Código Penal, no caso de coação moral irresistível, somente deve responder pela infração o autor da coação. 

Assim, na forma do art. 386, VI, do Código de Processo Penal, o réu deve ser absolvido. 

2.2 DAS TESES SUBSIDIÁRIAS 

Subsidiariamente, caso não seja acolhida a tese absolutória da coação moral irresistível, vem requerer: 

a) a aplicação da pena-base no mínimo legal, uma vez que, nos termos da Súmula 444 do STJ, inquéritos policiais e ações penais em curso não podem ser consideradas como circunstâncias judiciais desfavoráveis. Assim, o inquérito policial pela suposta prática de um crime de falsificação de documento particular não tem a força legal para elevar a pena-base acima do mínimo legal;

b) a atenuante da coação moral  a que podia resistir, prevista no art. 65, III, c, do Código Penal, uma vez que Astolfo somente transportou a droga por exigência de Russo;

c) a atenuante do art. 65, I, do Código Penal, já que o réu era maior de 70 anos na data da sentença;

d) a atenuante da confissão, prevista no art. 65, III, d, do Código Penal, mesmo tendo alegado causa excludente de culpabilidade, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido a confissão qualificada suficiente para atenuar a pena do réu; 

e) segundo se extrai do enunciado, o réu é primário, ostenta bons antecedentes e não há elementos no sentido de envolvimento com organização criminosa ou dedicação às atividades criminosas, o que legitima o réu a requerer a causa especial de diminuição de pena do tráfico privilegiado. Assim, requer a causa de diminuição da pena em patamar máximo, previsto no art. 33, §4º, da lei n. 11.343/2006;

f) com relação ao regime carcerário, em que pese o art. 2º, §1º, da Lei n. 8.072/90 prever a fixação do regime inicial fechado aos condenados por crimes hediondos ou equiparados, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inconstitucionalidade desse dispositivo por violação do princípio da individualização da pena, previsto no art. 5º, XLVI, da CF/88, sendo cabível, portanto, a fixação do regime inicial aberto de cumprimento da reprimenda legal; 

g) a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Isso porque, uma vez sendo reconhecido o tráfico privilegiado, com a diminuição da pena no patamar máximo, a pena definitiva não ultrapassará quatro anos. Lembrando que a vedação constante no art. 33, §4º, da Lei n. 11.343/2006, não mais subsiste, uma vez que, por meio da Resolução n. 05, publicada em 15.2.2012, o Senado suspendeu a execução da expressão "vedada a conversão em penas restritivas de direitos", sendo, pois, possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. 

3. DOS PEDIDOS

Diante do exposto, a defesa requer:

a) absolvição do crime de tráfico, com fundamento legal no art. 386, VI, do Código de Processo Penal;

b) subsidiariamente, a aplicação da pena-base no mínimo legal, por serem todas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, favoráveis; 

c) o reconhecimento das atenuantes do art. 65, I e III, alíneas c e d, do Código Penal; 

d) a aplicação do privilégio, causa especial de diminuição de pena, prevista no art. 33, §4º, da Lei n. 11.343/2006; 

e) a aplicação do regime inicial aberto de cumprimento de pena; 

f) a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. 

Termos em que 

Pede deferimento,

Local, 13 de março de 2015

Advogado, OAB n. ...

2 comentários:

  1. Show de bola hein pessoal ! Alguma outra peça disponivel ?

    ResponderExcluir
  2. No 2.0 do direito, não precisa escrever nada?

    ResponderExcluir