20 de mar. de 2019

Breves Análises: As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil - Cap. V: A população brasileira no ponto de vista da psicologia criminal – Índios e Negros (Raimundo Nina Rodrigues)

A população brasileira no ponto de vista da psicologia criminal – Índios e Negros (RODRIGUES, Raimundo Nina)

O autor começa o capítulo a questionar se em razão da localização inferior das raças ditas distintas e inferiores (negros e índios), pelos efeitos de seus atos, poderiam eles suportar, diante da lei, toda a carga da responsabilidade penal equivalente. Indaga se a consciência do direito e do dever a eles atribuída pode ser de igual sentido como aquela presente no homem branco civilizado. Rebusca ainda, se a convivência do índio e a submissão do negro com o homem branco seria capaz de neles se desenvolver a consciência do homem civilizado.

Nina Rodrigues entende negativamente. Nos negros submissos e índios domesticados emerge a aversão da punição, mas, nas suas palavras “absolutamente não terão consciência de que seus atos possam implicar a violação de um dever ou o exercício de um direito, diversos daquilo que até então era para eles direito e dever”. Assim, o psiquiatra brasileiro concebe a dificuldade de qualificar a responsabilidade de tais raças, ainda que já vinculadas à sociedade.

Rodrigues admite que o índio jamais se civilizou, mesmo o longo período de tempo em convívio com a raça branca e toda a dinâmica de catequização – que não considera processo de civilização, mas sim degradação – não foi suficiente para personificar o índio as têmperas, a natureza, o caráter da população branca. Prova disso é o seu extermínio no Brasil. A sua não incorporação aos contornos da raça civilizada justifica o seu processo de extinção. Nina afirma que a única forma que o índio concorre com a população branca é como mestiços.

Assevera, garante, solidifica, que a capacidade civilizatória do negro é inquestionável, e traz, a fim de confirmar suas convicções, e atribui a elas exatidão científica, fragmentos de transcrições de obras de alguns autores. Cita o Dr. Sylvio Romero (A emancipação dos escravos; Revista Brasileira, 1881): “A África esteve desde a mais remota antiguidade em contacto com os egípcios, persas, gregos, romanos, fenícios, cários e árabes, e o negro nunca chegou a civilizar-se! Há quatro séculos está em contacto com os modernos povos europeus e continua nas trevas”. Mais, com passagens agora de Abel Havelacque (Les negres de l’Afrique souséquatoriale, Paris, 1889):

"Será necessário declarar agora, que, traçando este esboço etnográfico, não fomos nem detrator sistemático, nem amigo cego do irmão negro? Que, por seu desenvolvimento intelectual e por sua civilização, os negros africanos sejam inferiores à massa das populações europeias, ninguém evidentemente pode pôr em dúvida. Ninguém pode duvidar tampouco de que anatomicamente o negro esteja menos adiantado em evolução do que o branco. Os negros africanos são o que são: nem melhores nem piores que os brancos; simplesmente eles pertencem a uma outra fase do desenvolvimento intelectual e moral. (...)"

Outrossim, Nina afirma que o negro não é competente, ou seja, não possui aptidão intelectual de se ajustar ao branco, ainda que tenha se libertado das amarras do trabalho forçado. Observa que nas civilizações europeias o negro preservou-se retardado, desfavorável, sendo incapaz de tomar benefício de um possível contexto social que poderia lhe ser benéfico, pois, ainda que possuindo liberdade, ele se desvia, discrepa-se. Nina expende que esta ‘negra’ natureza bruta, indelicada e atrasada produz a alma da comunidade delituosa e o corpo do crime.

Considera, portanto, nas suas palavras, que “a responsabilidade penal, fundada na liberdade do querer, das raças inferiores, não pode ser equiparada a das raças brancas civilizadas”. Entende que a resolução para tal questão não se dá no espírito geral da raça, mas na perspectiva das individualidades, na rota de indivíduos isolados, pois admite que há negros e índios que são raras exceções, e para estes, a responsabilidade penal deveria ser aplicada integralmente.

Contudo, mesmo estes raros sujeitos destacados atiram dúvidas, pois Nina infere que existe dentro deles o desacordo entre uma nova moral interna ainda não tão bem configurada - pois sua personificação fora periférica, não profunda, superficial – e os seus registros ancestrais, estes tão profundamente enraizados como frutos de uma árvore genealógica de antepassados, os quais determinam de forma incontrolável a sua natureza, os seus impulsos. Assevera que a ciência, na forma da psiquiatria, atestaria, precisamente, tomando como referência essas disposições, que o índio e o negro, são penalmente irresponsáveis.

Nina Rodrigues remata que exige um esforço descomunal tais raças se adaptarem neste novo contexto social que lhes fora imposto, pois o próprio esforço implica em desequilíbrio e pertubação. Observa que o fato dos negros e índios conservarem seus costumes ainda enquanto vivendo em uma nova atmosfera social é um sinal de que nas suas ações haverá a força do mando daquelas impressões selvagens do passado.

Para Nina, dessarte, o novo é uma aquisição, e o velho um atributo. O que é adquirido pode ser desligado, mas o que é atributo é espírito, intrínseco, é âmago, algo que jamais pode ser perdido. A combinação do novo com o velho, do presente com o passado, luz e escuridão, fixa negros e índios como indivíduos híbridos, num fardo permanente de serem antinaturais no novo meio social. Assenta, naturalmente, Nina, que, enquanto em estado selvagem, os negros e índios são de todo irresponsáveis, mas, enquanto complexos, é incontestável o seu direito de ter a responsabilidade atenuada. 

(RODRIGUES, Raimundo Nina. As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil [online]. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisa Social, 2011, 95p. ISBN 978-85-7982-075-5. Available from SciELO Books <http://books.scielo.org>)

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